Em breve, o aroma de pão quentinho vai carregar mais do que o cheiro de café da manhã pelas ruas de Boa Vista. Vai trazer junto histórias de recomeço. É essa a proposta do “Pão Nosso”, projeto da Associação Mexendo a Panela que vai capacitar e gerar renda para famílias em situação de vulnerabilidade, e que foi um dos selecionados pelo Fundo Social da cooperativa Sicredi Celeiro MT/RR em 2025.
A previsão é que o projeto comece a operar em outubro deste ano. Os trabalhos serão executados em um container, doado pelo Sicredi, que será transformado em sala de aula climatizada para cursos teóricos. As aulas práticas serão realizadas na cozinha da associação, onde já são preparadas diariamente refeições distribuídas a moradores de rua. O foco inicial será na área da panificação, mas também estão previstos cursos de confeitaria, manipulação de alimentos e atividades voltadas para geração de renda para as famílias, como manicure e pedicure.
Além de capacitar, o projeto vai distribuir cestas semanais de pão para famílias chefiadas por mulheres em situação de vulnerabilidade. “A cada semana, essas famílias vão retirar uma cesta de pães suficientes para o café da manhã durante sete dias. O excedente da produção será vendido para gerar recursos e sustentar o próprio projeto”, explica Áurea Cruz, coordenadora da Associação Mexendo a Panela.
Combate à fome e transformação social
A Associação Mexendo a Panela surgiu em 2017 servindo refeições a pessoas em situação de rua e, desde então, consolidou o projeto Sumaúma, que atualmente serve cerca de 800 refeições diárias. Em 2024, a iniciativa foi reconhecida pelo Pacto Contra a Fome como o melhor projeto de combate à fome do Brasil, contribuindo para a retirada do país do mapa da fome da ONU.
Áurea destaca que o “Pão Nosso” nasceu da necessidade de dar um passo além. “Não é só sobre entregar o alimento. Queremos que as pessoas aprendam uma profissão, tenham autonomia financeira e consigam sustentar suas famílias com dignidade. Hoje, com a crise humanitária vinda da Venezuela, muitas mulheres estão sozinhas com seus filhos e não conseguem sair de casa para trabalhar. O curso vai permitir que elas produzam e vendam de casa, sem abandonar o cuidado com as crianças”, afirma.
A nova estrutura permitirá também a realização de cursos de gestão e empreendedorismo.
“Queremos que as pessoas saiam daqui sabendo calcular custos, definir preços, separar o que é lucro e o que precisa ser reinvestido. É um pacote completo de capacitação para quem quer empreender ou conseguir um emprego formal em padarias, pizzarias e confeitarias”, complementa Áurea.
História de superação
Entre os beneficiados pelo trabalho da associação está Jimmy Alberto Burgos Vina, de 33 anos, natural de San Félix, no estado Bolívar, na Venezuela. Cozinheiro e padeiro, Jimmy vive em Roraima há quase quatro anos e chegou ao Brasil em busca de melhores condições de vida. Ele começou na Cáritas Brasileira como auxiliar de cozinha, aprendeu novas técnicas e foi promovido a cozinheiro. Agora, integra a equipe do “Pão Nosso”, onde também atua como padeiro.
“Estar nesse projeto muda totalmente a vida da gente. Já aprendi a fazer pães de milho, coco, goiabada e outras variedades. Como migrante é fundamental buscar evolução, aprender sempre e abrir portas para o futuro”, afirma. Para ele, a experiência vai muito além de uma função profissional. “Não é só sobre fazer pão, é sobre fazer parte de algo que ajuda outras pessoas, que dá esperança. É uma oportunidade de recomeçar”, resume.
A gerente de agência do Sicredi Claudiane Barbosa ressalta que a doação do container representa mais do que um aporte físico ao projeto. “Essa iniciativa reforça o nosso compromisso com o desenvolvimento da comunidade e com projetos que fazem a diferença na vida das pessoas. O trabalho da Associação Mexendo a Panela é essencial, oferecendo alimento e acolhimento para famílias em situação de vulnerabilidade. Com o container, a instituição poderá ampliar as atividades, melhorar a estrutura e atender ainda mais pessoas com dignidade e carinho”, afirma.
Fundo Social do Sicredi
O Fundo Social 2025 é um dos principais projetos da cooperativa para fomentar iniciativas com impacto positivo nas comunidades onde está presente, abrangendo áreas como esporte, meio ambiente, saúde, segurança, cultura, educação e inclusão social. Em 2024, o Sicredi destinou mais de R$ 75,5 milhões para 7.324 projetos sociais, beneficiando mais de 7,2 milhões de pessoas no Brasil. Na área de atuação da cooperativa Sicredi Celeiro MT/RR, já foram investidos R$ 12,7 milhões em 1.059 projetos desde quando iniciou os trabalhos com o fundo. Para 2025, os associados aprovaram R$ 2,5 milhões para iniciativas em Mato Grosso e Roraima. Em Boa Vista, dez entidades foram contempladas nesta edição, incluindo a Associação Mexendo a Panela. São elas:
- Associação União de Pais e Pessoas com Autismo – UPPARORAIMA
- Associação Mexendo a Panela
- Lions Clube de Boa Vista
- Associação Missões de Amor de Roraima – AMA
- Centro Terapêutico de Recuperação e Inserção Social da Pessoa com Dependência Química – Recanto de Davi
- Centro Terapêutico de Recuperação e Inserção Social da Pessoa com Dependência Química – Projeto Impacto
- Instituto Beneficente e Social Morada de Deus – Instituto Morada de Deus
- Associação de Apoio Comunitário de Boa Vista – AACBV
- Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais de Boa Vista – RR – APAE
- Centro de Serviço e Assistência Social Maria Ferna – CESASMAF
“Estamos orgulhosos de poder contribuir com projetos que fazem a diferença na vida das pessoas e da comunidade como um todo. Este investimento é um reflexo do nosso compromisso com o desenvolvimento das comunidades onde estamos presentes”, afirma Laercio Pedro Lenz, presidente da Sicredi Celeiro MT/RR.
Para Áurea, a parceria é decisiva para transformar o “Pão Nosso” em realidade. “Esse container é a peça que faltava para tirarmos o projeto do papel. Vamos capacitar, gerar renda e continuar combatendo a fome. É um trabalho que começa em Boa Vista, mas que pode servir de modelo para o Brasil e para o mundo”, conclui.
Comentários: