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Parteiras Indígenas: Saberes ancestrais e resistência na preservação da vida e da cultura em Roraima

Reportagem revela como o conhecimento tradicional de parteiras indígenas fortalece a saúde comunitária, a biodiversidade cultural e enfrenta desafios

Parteiras Indígenas: Saberes ancestrais e resistência na preservação da vida e da cultura em Roraima
Foto: Arquivo pessoal, dona Rosa.
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Como a força ancestral das parteiras indígenas segue desafiando os modelos hegemônicos de assistência à saúde materna? Em Roraima, território de grande diversidade étnica, mulheres como Rosa Maria Cadete e Yolanda Pereira continuam protagonizando práticas tradicionais que promovem cuidado, segurança alimentar e conexão espiritual durante o parto — muitas vezes em contraponto aos modelos hospitalares ocidentalizados.

Na comunidade indígena Kanauani, na região Serra da Lua, no município de Cantá, vive Rosa Maria, da etnia Wapixana. Parteira tradicional, ela relembra os mais de 50 partos que realizou desde a juventude. “Comecei com 17 anos. A gente dava coragem uma pra outra. Já fiz parto da filha de uma criança que ajudei a nascer. Isso é gratificante. Até hoje, quando me chamam, eu vou”, conta com simplicidade.

Yolanda Pereira, da comunidade Uiramutã, também começou cedo. Aos 18 anos, iniciou a prática do partejamento e hoje, aos 49, atua no DSEI-Leste dando palestras para profissionais da saúde sobre os cuidados tradicionais com gestantes indígenas. “No parto e no pós-parto, a gente acompanha tudo. Tem muito cuidado com a alimentação: nada de água fria, nem frutas doces. A gente oferece frango caipira, carne seca, chá de ervas. Tudo isso evita sangramentos fortes e cólicas”, explica.

Esses saberes não são apenas tradição — são também resistência. A atuação das parteiras indígenas contribui diretamente para o fortalecimento da medicina tradicional, a autonomia das comunidades, o respeito ao corpo feminino e a preservação de práticas sustentáveis. Trata-se de um cuidado com impacto ambiental quase nulo, com insumos naturais e sem a hipermedicalização do nascimento.

Dona Yolanda, contrasta as realidades: "É muito fora da nossa cultura, é muito diferente. A gente vê aí tudo muito liberado, a mãe acaba tendo sangramentos fortes, acaba tendo cólica, é um monte de coisa que acontece. Já na comunidade, não, a gente já cuida para não ter cólica, não ter sangramento forte, prolongado, tudo tem um cuidado."

Yolanda, compartilha suas esperanças: "Também tenho feito algumas palestras para os profissionais, tanto médico quanto enfermeiro, técnicos de enfermagem, em relação ao trabalho de partos na comunidade, como atender as mãezinhas da nossa comunidade."

"E hoje eu estou de novo na parte da coordenação da medicina indígena, já com algumas programações para a gente poder fazer as trocas de saberes nas regiões, trabalhando aí a parte da medicina tradicional, produção de remédios, também falar sobre as parteiras, o conhecimento da prática com as parteiras."

Embora ainda marginalizadas nas políticas públicas, essas práticas vêm ganhando mais espaço institucional. Em 2023, só a Maternidade Nossa Senhora de Nazareth, em Boa Vista, atendeu 2.621 gestantes indígenas oriundas dos Distritos Sanitários Especiais Indígenas do Leste (DSEI-L) e Yanomami (DSEI-Y). Para acolher melhor esse público, o Governo de Roraima implantou redários nas enfermarias e passou a oferecer alimentação diferenciada e uso de medicina tradicional, quando solicitado.

“Nós realizamos o acolhimento das gestantes indígenas com respeito à cultura delas. Redário, comida específica e até o uso de ervas quando é desejo da paciente. A ideia é humanizar o atendimento sem apagar os costumes”, explicou o coordenador de Atenção Indígena da unidade, Aharon Macuxi.

Mesmo com avanços, ainda há desafios logísticos e estruturais para a valorização plena da medicina indígena. Como lembra Yolanda, “a gente precisa de apoio para realizar encontros de saberes entre parteiras, produzir remédios naturais e garantir a continuidade desse conhecimento”.

A atuação das parteiras tradicionais, além de garantir o direito à saúde com respeito cultural, também revela um caminho possível para fortalecer práticas de sócio-bioeconomia, com impactos positivos na sustentabilidade e na soberania dos povos originários. Ao preservar os conhecimentos tradicionais e integrá-los às políticas públicas, a sociedade dá um passo importante rumo a uma transição justa e inclusiva, que respeite tanto a vida quanto a floresta.

FONTE/CRÉDITOS: Dennefer Costa Silva Honorato - jornalista Rádio Monte Roraima Fm
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